Reprise da Novela Pantanal Indenização por Direitos Morais do Autor

RECURSO ESPECIAL Nº 1.558.683 – SP (2015/0253997-2)
RELATOR : MINISTRO RICARDO VILLAS BÔAS CUEVAR.P/ACÓRDÃO : MINISTRO MOURA RIBEIRO
RECORRENTE : BENEDITO RUY BARBOSA
ADVOGADOS : JOSÉ CARLOS COSTA NETTO – SP047579
MARIA LUIZA DE FREITAS VALLE EGEA E OUTRO(S) – SP035225 ROBERTO MARQUES SOARES – SP015816
RECORRIDO : TVSBT CANAL 4 DE SÃO PAULO S/A
ADVOGADO : MARINA DE LIMA DRAIB E OUTRO(S) – SP138983
ADVOGADA : PATRICIA VASQUES DE LYRA PESSOA ROZA E OUTRO(S) – DF020213
EMENTA
RECURSO ESPECIAL. DIREITO AUTORAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. REEXIBIÇÃO DA TELENOVELA “PANTANAL”. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. OMISSÃO INEXISTENTE. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. DANOS MATERIAIS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS SOBRE DIREITOS AUTORAIS. ALEGADA OFENSA AO ART. 3º DA LEI Nº 5.988/73 (ATUAL ART. 4º DA LEI Nº 9.610/98). INOCORRÊNCIA. RENÚNCIA EXPRESSA. DANOS MORAIS. CONFIGURAÇÃO. OFENSA AO ART. 24, IV, DA LEI Nº 9.610/98 RECONHECIDA. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

1. Não há violação ao art. 535 do CPC se foram analisadas as questões controvertidas objeto do recurso pelo Tribunal de origem, ainda que em sentido contrário à pretensão do recorrente.

2. O dissídio jurisprudencial não foi comprovado, pois além de indicar o dispositivo legal e transcrever os julgados apontados como paradigmas, cabia ao recorrente realizar o cotejo analítico, demonstrando-se a identidade das situações fáticas e a interpretação diversa dada ao mesmo dispositivo legal, o que não ocorreu.

3. Não há que se falar em ofensa do art. 3º da Lei nº 5.988/73 (atual art. 4º da Lei nº 9.610/98) diante da renúncia expressa aos direitos assegurados em contrato celebrado entre as partes. Nenhuma interpretação, ainda que restritiva, pode ser conferida de modo a determinar um sentido contrário ao que o próprio recorrente livremente manifestou no ajuste. Por isso a Turma, por maioria, entendeu pelo descabimento do dano material.

4. Na análise do dano moral incide a Lei nº 9.610/98 e o CC/02, uma vez que o fato gerador, a retransmissão da telenovela, ocorreu entre 9/6/2008 e 13/1/2009, na vigência desses diplomas legais.

5. A renúncia aos direitos patrimoniais provenientes da exploração econômica da obra do autor não pode ser extensível aos direitos de personalidade, incluído o de natureza moral, que são intransmissíveis, inalienáveis e irrenunciáveis. Inteligência do art. 24, IV, da Lei nº 9.610/98 e do art. 6 bis da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas (Decreto nº 75.699/75).

6. A garantia à integridade da obra intelectual objetiva evitar sua desnaturação ou desrespeito às características que identificam. Na hipótese dos autos, os danos morais são devidos uma vez que os cortes de cenas e supressões de diálogos na telenovela “Pantanal” atingiram a honra e a reputação do autor.

7. Recurso especial provido em parte.

Análise do contexto da decisão judicial.

Para entender melhor essa demanda judicial temos que observar a Lei de Direito do Autor 9.610/98. Esta lei prevê que os direitos patrimoniais do autor, têm a ver com a exploração comercial da obra, ou seja, a faculdade de poder reproduzir, editar, traduzir, adaptar ou distribuir a obra podem ser transferidos por contato escritos com tal finalidade.

Por outro lado, os Direitos Autorais também garantem os chamados direitos morais do autor, que protegem a integridade da obra tal qual o autor a criou, desta forma qualquer alteração ou modificação dependerá sempre de prévia e expressa autorização. Diferentemente dos direitos patrimoniais, os direitos morais não podem ser transferidos, alienados ou negociados por qualquer tipo de contrato ou avença.

A decisão do STJ sobre a demanda judicial  a obra coletiva (novela Pantanal), no qual o autor Benedito Ruy Barbosa pediu indenização por danos patrimoniais e morais em decorrência do reprise feito pelo SBT, é inédita no Poder Judiciário por dirimir questões conflitantes em primeira e segunda instâncias, a maioria da 3ª Turma do STJ no julgamento do Recurso Especial nº 1.558.683/SP, decidiu finalmente: quanto aos danos patrimoniais, o STJ considerou que o autor renunciou aos seus direitos no contrato que assinou em 1995. Portanto, qualquer valor arrecadado pelo SBT com a reprise de Pantanal não pertence a Benedito. Já em relação aos danos morais, o autor afirmou que a versão exibida pelo SBT em 2008 possuía muitos cortes em cenas e diálogos, o que poderia manchar sua reputação.

Neste caso, o STJ considerou que o autor é participante da obra coletiva da novela e, portanto, tem direitos garantidos pela Constituição Federal de 1988.  Vale dizer: Benedito Ruy Barbosa por ser participante de obra coletiva (novela), na qualidade de escritor tem seus direitos garantidos pela Constituição Federal de 1988, cujo artigo 5º, inciso XXVIII, assegura a proteção das participações individuais em obras coletivas. A mesma proteção está expressa no artigo 17 da Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/1998).

Por sua vez, o SBT se defendeu dizendo que os cortes e alterações já haviam sido feitos quando as fitas foram compradas, e isto se mostrou verdadeiro, após várias análises. Mesmo assim, o SBT foi responsabilizado por reexibir a novela sob essas circunstâncias.

O sucesso da novela Pantanal, se depender do Poder Judiciário já está garantido para todos aqueles que estudam, pesquisam e advogam na área dos Direitos Autorais, pois estamos aqui diante de um julgamento histórico do STJ, que envolveu inúmeras questões de Direitos Autorais, no tocante aos Direitos patrimoniais e morais do Autor, que com certeza serão parâmetros que deverão ser observados em futuros contratos e julgados.

Análise Jurídica.

O Recurso Especial nº 1.558.683, julgado pelo STJ, trata de uma controvérsia envolvendo a violação de direitos autorais relativos à reexibição da telenovela “Pantanal”. O autor, Benedito Ruy Barbosa, ajuizou ação de indenização por danos materiais e morais contra o SBT, devido à retransmissão da obra com cortes de cenas e diálogos, sem a sua autorização expressa.

A decisão do STJ aborda aspectos cruciais sobre os direitos autorais, distinguindo claramente entre os direitos patrimoniais e os direitos morais do autor. Enquanto os direitos patrimoniais podem ser transferidos ou renunciados por meio de contrato, os direitos morais são inalienáveis, irrenunciáveis e intransferíveis, conforme a Lei 9.610/98 e a Convenção de Berna. Este julgamento destaca a proteção da integridade da obra, que visa evitar qualquer modificação ou desnaturação da criação original.

Aspectos Jurídicos Relevantes.

  1. Renúncia aos Direitos Patrimoniais: A decisão do STJ entendeu que Benedito Ruy Barbosa renunciou aos seus direitos patrimoniais no contrato assinado com o SBT em 1995, o que afastou a possibilidade de cobrança de danos materiais pela exploração econômica da obra na sua reexibição. Ou seja, o autor renunciou à possibilidade de receber pela reexibição da telenovela “Pantanal”, o que foi interpretado como uma renúncia válida dos seus direitos patrimoniais.
  2. Direitos Morais do Autor: A violação dos direitos morais foi reconhecida, pois a alteração da obra original, com cortes de cenas e diálogos, afetou a honra e a reputação do autor, o que ensejou a condenação por danos morais. O STJ baseou-se na proteção dos direitos morais do autor, que são garantidos pela Constituição Federal de 1988 e pela Lei nº 9.610/98, e não podem ser renunciados ou modificados, mesmo que o autor tenha cedido os direitos patrimoniais.
  3. Implicações para a Indústria Audiovisual: Este caso é histórico porque, além de reforçar a proteção dos direitos morais do autor, destaca a responsabilidade das emissoras de televisão em garantir que as obras reexibidas respeitem a integridade da obra original. A decisão pode servir de parâmetro para futuras negociações de contratos na indústria audiovisual, destacando a necessidade de atenção às questões de direitos autorais, especialmente no que se refere às modificações nas obras coletivas.
  4. Jurisprudência e Precedentes: A decisão também é importante por ser baseada na interpretação da Lei nº 9.610/98, e pode influenciar futuras decisões sobre a proteção das obras coletivas, como novelas e filmes. A decisão do STJ reforça a ideia de que, embora a transferência dos direitos patrimoniais seja possível, a preservação da integridade da obra e o respeito pelos direitos morais do autor são questões que não podem ser negociadas.

Conclusão:

O julgamento do Recurso Especial nº 1.558.683 esclarece aspectos fundamentais sobre a divisão entre direitos patrimoniais e morais do autor, consolidando o entendimento de que a modificação da obra sem autorização pode causar danos morais, mesmo que os direitos patrimoniais tenham sido previamente cedidos. A decisão fortalece a proteção dos direitos morais dos autores, especialmente em obras coletivas, e traz um importante precedente para a indústria audiovisual.

O julgamento esclarece aspectos fundamentais sobre a divisão entre direitos patrimoniais e morais do autor, consolidando o entendimento de que a modificação da obra sem autorização pode causar danos morais, mesmo que os direitos patrimoniais tenham sido previamente cedidos. A decisão fortalece a proteção dos direitos morais dos autores, especialmente em obras coletivas, e traz um importante precedente para a indústria audiovisual.

Marcos Wachowicz Autor
Publicado em 24/06/2022
Atualizado em 26/11/2024
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