Programas de Computador. Violação de Direitos Autorais. Aquisição Irregular

VOTO Nº: 22768
APELAÇÃO CÍVEL N. 1001570-58.2019.8.26.0577
COMARCA: FORO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS
APELANTE: MHT TECNOLOGIA E IMPORTAÇÃO EIRELI
APELADO: MICROSOFT COPORATION
JUIZ: DR. EDUARDO DE FRANÇA HELENE

R.G.

Apelação cível. Ação de indenização. Programas de software com violação a direito autoral, não tendo licença válida ou nota fiscal que comprove sua aquisição. Ação cautelar de produção antecipada de provas. A regular aquisição de um programa de computador e sua respectiva comprovação, se dá através de nota fiscal ou contrato de licença, não apresentadas. De rigor a condenação da ré na indenização à parte autora por violação à sua propriedade intelectual de programa de computador e sua comercialização, conforme disciplina a Lei 9.610/98.

Ainda que o juízo de origem intitule a indenização a ser pago a título de danos morais, na verdade trata-se de danos materiais que, como vasta jurisprudência e precedentes do C. STJ deve ser não só compensatória, mas também sancionatória, sem, no entanto, implicar enriquecimento sem causa do titular dos direitos autorais violados.

A base de cálculo utilizada é razoável, considerando a variedade do valor do mercado, com a sua consequente média e estimativa de programa subsequente aos que foram retro descontinuados. No caso específico, majoração do valor a ser indenizado em 5 vezes o valor apurado em perícia. A correção monetária deve incidir a partir da data em que aferido o preço de mercado dos softwares, a fim de preservar seu valor real. Os honorários advocatícios forma devidamente arbitrados, com fulcro no artigo 85, § 2º, do CPC. Apelo do autor parcialmente provido e desprovido o direito do réu.

Trata-se de ação de indenização ajuizada por MICROSOFT CORPORATION contra MHT TECNOLOGIA e IMPORTAÇÃO EIRELI, alegando a parte autora que a ré teria se valido indevidamente de programas de software com violação a direito autoral, não tendo licença válida ou nota fiscal que comprove sua aquisição, conforme demonstrado em ação cautelar de produção antecipada de provas, pleiteando-se indenização por dano moral no importe de 10 vezes o valor de cada licença de programa em uso irregular e pagamento de custas, despesas processuais, honorários advocatícios, honorários periciais e diligências, referente à ação cautelar e ao presente feito. A sentença de págs. 219/222, cujo relatório se adota, julgou procedente a ação para condenar a ré MHT TECNOLOGIA E IMPORTAÇÃO EIRELI ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ R$ 34.755,00 (trinta e quatro mil, setecentos e cinquenta e cinco reais), corrigido monetariamente desde esta decisão, acrescido de juros de mora de 1% ao mês desde a data da vistoria para averiguação da contrafação, 26 de junho de 2018 (fls. 114), correspondendo à data do ilícito em casos de responsabilidade extracontratual, nos termos do enunciado 54, da súmula do STJ; condenar a requerida ao pagamento de honorários periciais, por metade do valor adiantado pela requerente nos autos nº 1033051-10.2017.8.26.0577, visto a ação cautelar possuir dois autores, presumindo-se que o adiantamento foi procedido por metade cada um. Tal valor adiantado pela autora deverá ser comprovado na fase de liquidação de sentença, já que não consta tal informação nestes autos. Por fim, condenou a ré ao pagamento de custas, despesas processuais e honorários advocatícios, no importe de 15% sobre o valor da condenação, somente com relação a este feito, não se levando em consideração a ação cautelar, visto que naqueles autos não há sucumbência, diante a natureza da ação, com fulcro no art. 85, §2º, do CPC. Os honorários advocatícios serão corrigidos monetariamente desde esta decisão, acrescidos de juros legais de 1% desde a data do trânsito em julgado. Apelação interposta às págs. 229/242 pelo réu alegando ausência de provas e inexistência de violação a direito autoral. Diz que a conclusão do perito que somente as notas fiscais seriam documentos aceitos como demonstração de regularidade no uso de softwares não deve prosperar. Afirma que não violou direitos autorais a ensejar o pleito de indenização em qualquer esfera, tampouco em danos morais como deferido. Aduz que habitualmente as empresas e também as pessoas físicas adquirem computadores em lojas, sites, supermercados e etc, onde a instalação de tais programas já vem nos equipamentos, como item de fábrica. Diz terem sido extraviadas as notas fiscais. Reconhece que pode ter havido a instalação de softwares irregulares por terceiros, mas sem qualquer ciência ou autorização do apelante. Alega que inexiste danos morais, e que se mantida sua culpa, aplica-se tão somente uma reparação material. Porém, aduz que os programas encontrados em seus equipamentos não são mais comercializados e não possuem um valor estabelecido, logo, os valores atuais de programas mais modernos não devem ser tidos como base, visto que não se tratam de mesmos itens e são bem mais elevados. Por fim, insurge-se com sua condenação a título de honorários advocatícios.

(…)

Do exposto, dou parcial provimento ao direito do autor e nego provimento ao recurso do réu. SILVÉRIO DA SILVA Relator.

Agora veja a integra do VOTO Nº: 22768 para melhor compreensão da analise abaixo da vexata questio.

Relato Jurídico – Apelação Cível 1001570-58.2019.8.26.0577

Contexto da Ação

A Apelação Cível nº 1001570-58.2019.8.26.0577 trata de uma ação de indenização movida pela Microsoft Corporation (apelante) contra a MHT Tecnologia e Importação EIRELI (apelada), com o objetivo de obter reparação pelos danos materiais e morais decorrentes do uso indevido de programas de software sem a devida licença, violando os direitos autorais da autora. A ação teve início com uma ação cautelar de produção antecipada de provas, na qual a apelante alegou que a ré utilizava softwares pirateados, sem comprovação de aquisição regular por meio de nota fiscal ou contrato de licença.

Argumentos da Parte Apelante

A Microsoft afirmou que a ré estava utilizando ilegalmente softwares de sua propriedade sem a devida licença, o que constitui uma violação de seus direitos autorais. Para a empresa, a falta de documentação comprobatória (como nota fiscal ou contrato de licença) demonstrava a utilização irregular dos programas, razão pela qual foi pleiteada a indenização por danos materiais e morais, com base na Lei 9.610/98, que regula os direitos autorais.

Argumentos da Parte Apelada

A MHT Tecnologia e Importação EIRELI (ré) se defendeu afirmando que os softwares utilizados haviam sido instalados sem seu conhecimento ou autorização, sendo, portanto, uma falha de terceiros. A apelada também alegou que os programas piratas não estavam mais em circulação e que, portanto, não seria adequado utilizar os preços de softwares mais modernos como base para a indenização. Quanto aos danos morais, a ré afirmou que não houve intencionalidade e que a simples utilização não autorizada dos programas não seria suficiente para justificar a indenização por danos morais.

Análise da Decisão

  1. Propriedade Intelectual: O Tribunal reconheceu que a Microsoft é a legítima proprietária dos softwares utilizados pela apelada, tendo sido comprovada a violação de seus direitos autorais. A falta de documentos que comprovassem a aquisição regular dos programas (como nota fiscal ou contrato de licença) fortaleceu o entendimento de que houve a utilização indevida de software.
  2. Danos Materiais e Morais: A decisão abordou a questão da indenização, destacando que, embora a Microsoft tenha solicitado danos morais, a jurisprudência predominante considera que, no contexto de violação de direitos autorais, a indenização deve ser material. O Tribunal determinou que o valor da indenização fosse baseado na quantificação do valor do software apreendido, considerando a média do mercado e a estimativa do valor dos programas descontinuados.
  3. Caráter Punitivo e Pedagógico: O Tribunal seguiu precedentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que destacam que a indenização no caso de uso indevido de software tem caráter punitivo e pedagógico, visando desestimular a prática de pirataria de programas. O valor de indenização foi majorado para cinco vezes o valor apurado na perícia, considerando a gravidade da infração.
  4. Honorários e Custas: O Tribunal também ratificou a condenação da ré ao pagamento de honorários advocatícios de 15% sobre o valor da condenação, conforme art. 85, §2º, do CPC. O Tribunal também determinou a correção monetária e a aplicação de juros legais sobre os valores devidos.

A Indenização por Contrafação de Software seguiu também os parâmetros do REsp 1.403.865 SP

Em consonância com os precedentes do Colendo Superior Tribunal de Justiça, especialmente no recurso especial nº 1.403.865, relatado pela Ministra Nancy Andrighi, é imperativo discutir a natureza e a finalidade da indenização em ações de contrafação de programas de computador, conforme preceitua o artigo 102 da Lei 9.610/98.

A ação de indenização, ajuizada em 14 de março de 2003, trouxe à tona a questão da adequação dos critérios utilizados para a fixação do valor indenizatório em decorrência da utilização ilegítima de softwares desenvolvidos pela recorrente. A interpretação do artigo mencionado revela que a indenização possui um caráter punitivo e pedagógico, refletindo a intenção do legislador de inibir práticas ilícitas semelhantes no futuro.

A simples compensação financeira, por sua vez, não apenas se mostra conivente com a conduta ilícita, mas também pode incentivar a prática de contrafação, uma vez que o infrator, ao assumir o risco de utilizar ilegalmente os programas, pode considerar que, se processado, a penalidade se restringirá ao pagamento de um valor correspondente às licenças. Tal situação é indesejável e contrária aos princípios que regem a proteção da propriedade intelectual.

Ademais, a quantificação da sanção para o uso indevido de obras protegidas, na ausência de comercialização, não é explicitamente disciplinada pela Lei 9.610/98. Portanto, cabe ao julgador, à luz do caso concreto, aplicar critérios que reflitam os princípios de equidade e justiça, levando em consideração a gravidade da ofensa e seus impactos.

Nesse contexto, é razoável que a indenização seja majorada para um montante equivalente a dez vezes o valor dos programas apreendidos, em consonância com os acórdãos paradigmáticos apresentados pela recorrente e com os precedentes deste Tribunal em casos análogos. Assim, a quantificação da indenização deve servir não apenas para compensar o titular dos direitos violados, mas também para desestimular a prática ofensiva, evitando, contudo, o enriquecimento sem causa do autor da ação. Diante do exposto, o recurso especial foi provido, reafirmando a necessidade de que a indenização pela utilização de software sem a devida licença cumpra sua função dissuasória, contribuindo para a proteção dos direitos autorais e a integridade do mercado de software.

Conclusão

A Apelação Cível foi parcialmente provida, e a sentença de primeira instância foi mantida, com a majoração da indenização para um valor mais alto do que o inicialmente estipulado, com base nos valores de mercado.

A decisão enfatizou o caráter sancionatório da indenização, com a intenção de desestimular a prática de uso ilegal de software.

 

A decisão enfatizou o caráter sancionatório da indenização, com a intenção de desestimular a prática de uso ilegal de software.

Marcos Wachowicz Autor
Publicado em 01/11/2021
Atualizado em 26/11/2024
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