A MAIS ANTIGA MARCA DA HUMANIDADE
O caso da marca antiga que foi copiada e distribuída por vários pontos do Mediterrâneo.
Bem vindo ao IODA, jovem padawan!
Nesse estudo de Priscila Pugsley Grahl de Miranda vamos conhecer a marca mais antiga na história da humanidade. E o papel do Direito nesse fenômeno.
Deixe suas dúvidas nos comentários!
Boa viagem!
Antes de mais nada: pense em uma marca antiga!
Eu acredito que várias passaram por sua mente.
Você deve ter lembrado de um nome, de uma forma. Quem sabe uma cor, ou um jingle.
Mas o conceito de marca pode ser mais antigo do que você imagina.
O INPI afirma que a “marca é um sinal distintivo cujas funções são identificar a origem e distinguir produtos ou serviços de outros idênticos, semelhantes ou afins de origem diversa”.
As marcas são como rostos para diversos campos do conhecimento humano.
Atualmente, o Design as cria, e o Direito as protege. Elas têm história.
Então, nesse estudo, vamos contemplar o passado de, talvez, a marca mais antiga utilizadas pelo ser humano.
Ela foi criada como assinatura em um produto muito popular, na época e hoje em dia: as lâmpadas.
O surgimento das lâmpadas
Hoje em dia, os grandes centros urbanos são iluminados por energia elétrica. Entretanto, nem sempre foi assim.
A invenção da lâmpada elétrica, por Thomas Edison, surgiu só no final do séc. XIX. E como era a vida antes disso?
Antes de tudo, a iluminação era feita por velas, tochas, lampiões a óleo, querosene, gás ou mesmo lâmpadas e candeeiros.
Na história da humanidade, os primeiros objetos que serviram de lâmpadas, foram conchas ou pedras com cavidades. Então, em seu interior, alguém inseria gordura de animal e acendia um pavio, normalmente, feito com fibras de plantas.
As lâmpadas de barro, que serão nosso objeto de estudo, surgiram, então, ao redor do segundo milênio a.C.
As lâmpadas no mundo hebreu
A princípio, quem já leu a Bíblia Hebraica ,deve ter encontrado muitas vezes a palavra lâmpada.
Nesse sentido, é famoso um versículo atribuído ao rei Davi, encontrado no livro de Salmos 119:105: “Tua palavra é lâmpada para os meus pés e uma luz para o meu caminho”.
Então, podemos imaginar o item citado como a foto abaixo.
Salomão, filho do rei Davi, também aparece como autor de alguns livros da Bíblia Hebraica, entre eles, Provérbios. No capítulo 31:18, ele menciona as lâmpadas.
Narra, então, que a mulher virtuosa “sabe que os negócios vão bem, e de noite sua lâmpada não se apaga”. O trecho, apesar de curto, traz diversas informações sobre o cotidiano doméstico na época.
Em primeiro lugar, nos informa da importância das lâmpadas no período noturno. As vilas, ou mesmo cidades não tinham iluminação pública. As casas, ao anoitecer, deveriam ser muito escuras e uma lâmpada acesa era essencial. Para que cumprisse seu papel de iluminar, era necessário um estoque de azeite.
Em segundo lugar, revela que uma mulher sábia, dona do seu lar, não poderia deixar faltar esse recurso.
As lâmpadas no Novo Testamento
Além disso, outra história sobre as lâmpadas encontra-se no livro de Mateus, capítulo 25. É a Parábola das Dez Virgens, que a tradição atribui a Jesus. Nela também é evidente a importância do azeite no período noturno para iluminar fora de casa.
No episódio, dez mulheres esperavam, ao ar livre, pela chegada de um noivo que tardava para o casamento. Destas, apenas cinco possuíam azeite extra para iluminar durante a longa espera. No meio da noite, as cinco que não tinham o combustível extra ficaram sem o material. Por conseguinte, precisaram correr para consegui-lo, tarde da noite. E então, acabaram perdendo o casamento.
O azeite
Dessa forma, combustíveis como o azeite eram fundamentais no dia a dia da Antiguidade.
O azeite de oliva é produto do fruto da oliveira. Quando a azeitona esta no ponto, ela é colhida e levada a um lagar, e então prensada. Posteriormente, é triturada, e tanto o fruto quanto caroço, transformam-se em azeite.
Além disso, Hebreus, fenícios, gregos e romanos também cultivavam oliveiras.
Então, esse produto fazia parte da tríade mediterrânea, junto com o vinho, e o trigo (base da alimentação de diversos povos).
Além disso, o azeite era usado na culinária, ou como matéria prima de remédios, e também em massagens. Também era muito utilizado em rituais religiosos, como mostram diversas escavações arqueológicas em templos.
Para se transportar em grandes quantidades, era necessário as ânforas.
O uso do dia a dia
O Museu Público de Milwaukee descreve o uso cotidiano das lamparinas a óleo.
A princípio, donos de estalagens e bares as usavam para iluminar seus negócios e as ruas próximas.
Os nobres para trazer luz aos caminhos quando eles ou seus convidados saíam depois de escurecer. Os soldados, então, as usavam para iluminar os seus fortes e postos militares.
As lâmpadas podiam também iluminar eventos esportivos noturnos. Já em teatros, além da iluminação, serviam também para indicar que uma cena se passava a noite.
Além disso, acredita-se que pescadores usavam lâmpadas em seus barcos (com azeite ou gordura animal) durante excursões noturnas de pesca. Quando estavam no mar, as galeras provavelmente tinham lâmpadas penduradas na popa para indicar suas posições umas às outras.
Nesse sentido, o museu também descreve o uso religioso desses itens. Em Roma, por exemplo, algumas práticas religiosas necessitavam de sacrifícios ou oferendas rituais. A luz era, então, significado de bênção e uma lâmpada com óleo poderia ser uma oferenda para cumprir um voto. Elas também eram enterradas com os mortos para iluminar seu caminho na vida para o além.
A marca mais antiga da humanidade
Acredita-se que na Índia já se usavam marcas como forma de assinatura, bem como na Grécia, mas, foi no Império Romano que elas despontaram!
Mas antes, é interessante ressaltar que na Antiguidade o sentido de marca é um tanto diferente do atual. A marca antiga era útil para distinguir produtos e os artesãos que os produziam. Serviam para o controle da circulação das mercadorias, bem como para o recolhimento de impostos. Arqueólogos, hoje em dia, utilizam as marcas antigas para descobrir de onde vem alguns produtos, e até quão longe foram comercializados pelo império.
Se fizéssemos uma visita a algum mercado romano no passado, possivelmente, encontraríamos muitas opções de lâmpadas. As feitas de terracota eram um item bem popular, como você já deve ter percebido.
No Império Romano, por serem pequenas e baratas, foram o primeiro item produzido em massa. Então, foi o berço da marca antiga. Eram elaboradas, por distintas fábricas como STROBILI, COMMUN, PHOETASPI, EUCARPI, e a mais famosa: FORTIS. Esses produtos tinham uma marca distintiva na parte inferior.
Um achado arqueológico no século XXI mostra que a região de Módena, antiga Mutina, era um importante centro de fabricação de lâmpadas. E, talvez seja lá a sede da oficina da FORTIS.
Criada por L. Aemilius Fortis, a marca antiga foi tão famosa por sua qualidade que foi difundida por grande parte do Império Romano, como mostram os achados arqueológicos. Importante ressaltar que além da qualidade, o produto era fácil de ser transportado, o que explica sua propagação.
Uma marca antiga vira uma nova palavra
A palavra FORTIS foi tão importante que passou de marca para um termo genérico no vocabulário. Isto é, para se referir a um tipo específico de lâmpada, lucerne a canale, falava-se apenas FORTIS. Lucerne é “lâmpada a óleo” em latim.
Esse fenômeno demonstra o reconhecimento de uma marca pelo consumidor. Além disso, não é raro e é muito conhecido aqui no Brasil. Assim como Bombril é uma marca de esponja de aço, e Gilete é uma marca de lâminas de barbear, a marca antiga FORTIS migrou de uma marca de lucerne a canale para a referência principal do produto.
Nasce a marca, nasce a pirataria
Antes de tudo, pirataria é o ato de copiar sem autorização a obra de um autor. Seja para comercialização ilegal, ou uso pessoal.
A princípio, acredita-se que um dos primeiros produtos a serem pirateados na história, foram as lâmpadas FORTIS. Arqueólogos descobriram que na Antiguidade, havia um grande mercado irregular de cópias. Diversas imitações de lâmpadas com a marca FORTIS foram descobertas ao redor do Império.
Christopher May, então, afirma que a marca FORTIS sofreu com diversas oficinas não autorizadas, entre elas uma na Bélgica. A qualidade, no entanto, não chegava aos pés do original. Era mais utilizada para ser exportada e enganar quem não conhecia o produto verdadeiro.
As cópias não autorizadas e a Lei para proteger a marca antiga
Refletindo sobre as marcas na Antiguidade, May faz interessantes revelações.
Assim, ele afirma que a marca representava a honestidade ou integridade de cada fabricante. Que era impossível para o criador de uma marca iniciar uma ação civil contra a falsificação de um de seus produtos.
Entretanto, na lei romana, um comprador poderia sim entrar com uma ação contra o vendedor de mercadorias falsificadas. Seja por engano ou intenção de fraudar.
É provável que o criador da marca não tivesse nenhum direito especial sobre ela. A lex cornelia de iniuris de cerca de 81 d.C. afirmava que tomar o nome de outro para obter lucro era proibido. Contudo, não há evidência que essa lei tenha sido utilizada para punir as cópias piratas do comércio romano.
Acredita-se que a marca FORTIS tenha sido produzida do ano 70 até o 230 da era comum, conforme achados arqueológicos.
CONCLUSÃO
Por fim, podemos concluir que as marcas não são um fenômeno novo, surgido na Era Industrial.
Elas já estavam presentes na Antiguidade.
Possuíam difusão, diversidade e competitividade entre si. Serviam como garantia de qualidade e assinatura de confiança. Eram, então, reconhecidas e escolhidas pelo consumidor.
E por causa disso, nasce a pirataria como a cópia não autorizada de uma obra registrada, com a intenção de enganar.
Deixando clara, a necessidade, e importância, do Direito para regular e proteger a criação do autor.