{"id":8977,"date":"2025-07-09T21:25:19","date_gmt":"2025-07-10T00:25:19","guid":{"rendered":"https:\/\/ioda.org.br\/?p=8977"},"modified":"2025-07-15T20:37:01","modified_gmt":"2025-07-15T23:37:01","slug":"avatar-direito-autoral","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/ioda.org.br\/publicacoes\/jurisprudencia-internacional\/avatar-direito-autoral\/","title":{"rendered":"Cria\u00e7\u00e3o de Avatares sem prote\u00e7\u00e3o pelo Direito Autoral no M\u00e9xico"},"content":{"rendered":"

A Suprema Corte de Justi\u00e7a da Na\u00e7\u00e3o do M\u00e9xico<\/strong> (SCJN), que \u00e9 o \u00f3rg\u00e3o m\u00e1ximo da justi\u00e7a naquele pa\u00eds, tomou uma decis\u00e3o muito importante e exemplar sobre um tema atual e de grande impacto para neg\u00f3cios e tecnologia: a prote\u00e7\u00e3o legal de cria\u00e7\u00f5es feitas por intelig\u00eancia artificial (IA).<\/p>\n

Em uma a\u00e7\u00e3o que chegou at\u00e9 \u00faltima inst\u00e2ncia e que ganhou grande repercuss\u00e3o na m\u00eddia mexicana<\/strong><\/a>, a corte decidiu, de forma un\u00e2nime, que imagens ou avatares criados exclusivamente por sistemas de Intelig\u00eancia Artificial Generativa n\u00e3o podem ser protegidos como obras autorais<\/strong>.<\/p>\n

Isso significa que, para o \u00f3rg\u00e3o judicial mexicano, o direito autoral que \u00e9 o conjunto de regras que garante ao criador de uma obra intelectual o reconhecimento e a exclusividade sobre ela, n\u00e3o se aplica a cria\u00e7\u00f5es de IA que foram geradas automaticamente, sem a interven\u00e7\u00e3o criativa significativa de um ser humano.<\/p>\n

No caso espec\u00edfico, foi rejeitado o pedido de registro de direitos autorais feito por Gerald Garc\u00eda B\u00e1ez<\/strong> tentando proteger um avatar que foi produzido por um programa de intelig\u00eancia artificial.<\/p>\n

O entendimento da corte mexicana refor\u00e7a a ideia de que a criatividade atribu\u00edda \u00e0 IA n\u00e3o \u00e9 suficiente para conceder direitos de autor, e que as leis de propriedade intelectual devem continuar protegendo exclusivamente as cria\u00e7\u00f5es humanas.<\/p>\n

Essa decis\u00e3o \u00e9 paradigm\u00e1tica porque indica claramente os limites legais atuais para a prote\u00e7\u00e3o de conte\u00fados produzidos por IA, impactando diretamente estrat\u00e9gias corporativas que envolvem o uso dessas tecnologias, principalmente no que diz respeito \u00e0 titularidade, licenciamento e explora\u00e7\u00e3o comercial dessas cria\u00e7\u00f5es.<\/p>\n

O CASO JUR\u00cdDICO EM QUEST\u00c3O<\/h2>\n

No caso em quest\u00e3o, autor Gerald Garc\u00eda B\u00e1ez<\/strong> buscou registrar legalmente a imagem de um avatar que foi criado com o aux\u00edlio de um software de Intelig\u00eancia Artificial chamado Leonardo AI. No entanto, seu pedido foi recusado pelo Instituto Nacional de Direito de Autor do M\u00e9xico<\/strong> (INDAUTOR)<\/a>, o \u00f3rg\u00e3o respons\u00e1vel por conceder esse tipo de prote\u00e7\u00e3o.<\/p>\n

O autor Gerald B\u00e1ez argumentou que, embora ele pr\u00f3prio n\u00e3o tenha desenhado diretamente o avatar, j\u00e1 que a cria\u00e7\u00e3o foi gerada digitalmente pela IA, ele teve um papel ativo e significativo no processo criativo.<\/p>\n

Isso inclui a escolha das fotografias que funcionaram como base para a gera\u00e7\u00e3o da imagem, a elabora\u00e7\u00e3o cuidadosa dos \u201cprompts<\/em><\/strong>\u201d, ou seja, as instru\u00e7\u00f5es espec\u00edficas e detalhadas que foram inseridas no programa para guiar a cria\u00e7\u00e3o, al\u00e9m da sele\u00e7\u00e3o da melhor vers\u00e3o entre os diversos modelos oferecidos pela plataforma.<\/p>\n

Ao ter seu pedido negado pelo INDAUTOR, Garcia B\u00e1ez recorreu ao sistema judicial, fundamentando sua a\u00e7\u00e3o nos artigos 12 e 18 da Lei Federal de Direito de Autor mexicana<\/strong><\/a>. Ele sustentou que o avatar final resultante deveria ser considerado uma obra protegida, pois reflete sua vontade, criatividade e contribui\u00e7\u00e3o subjetiva enquanto ser humano, mesmo que a execu\u00e7\u00e3o t\u00e9cnica tenha sido feita pela intelig\u00eancia artificial.<\/p>\n

Essa controv\u00e9rsia traz \u00e0 tona uma discuss\u00e3o central sobre at\u00e9 que ponto a interven\u00e7\u00e3o humana nesses processos auxiliados por IA pode ser considerada efetivamente criativa para fins de prote\u00e7\u00e3o legal.<\/p>\n

Para as empresas, \u00e9 fundamental entender esse limite, pois grande parte do conte\u00fado digital contempor\u00e2neo \u00e9 produzido com tecnologias similares, e a defini\u00e7\u00e3o clara dos direitos de autoria influencia diretamente investimentos, propriedade intelectual e estrat\u00e9gias comerciais envolvendo cria\u00e7\u00f5es digitais e inova\u00e7\u00e3o tecnol\u00f3gica.<\/p>\n

DECIS\u00c3O DA SUPREMA CORTE MEXICANA<\/h2>\n

A Segunda Turma da Suprema Corte do M\u00e9xico proferiu uma decis\u00e3o crucial que estabelece um precedente importante para o uso de cria\u00e7\u00f5es oriundas de intelig\u00eancia artificial (IA) no campo da propriedade intelectual.<\/p>\n

A corte esclareceu que obras que s\u00e3o totalmente geradas por sistemas de IA, sem uma interven\u00e7\u00e3o humana significativa, n\u00e3o satisfazem os requisitos legais para que se reconhe\u00e7a titularidade autoral. Isso ocorre porque, diferentemente de humanos, sistemas de IA n\u00e3o t\u00eam consci\u00eancia, vontade pr\u00f3pria ou intencionalidade \u2014 aspectos fundamentais para a caracteriza\u00e7\u00e3o da autoria segundo a legisla\u00e7\u00e3o vigente.<\/p>\n

Al\u00e9m disso, a decis\u00e3o enfatizou que, independentemente do valor art\u00edstico ou est\u00e9tico da obra produzida por IA, ela n\u00e3o pode ser enquadrada como uma \u201cobra\u201d nos termos da lei de direitos autorais, j\u00e1 que carece do elemento humano essencial que comp\u00f5e a subjetividade e criatividade necess\u00e1rias para prote\u00e7\u00e3o legal. Neste sentido o texto do julgado evidencia:<\/p>\n

62. En la actualidad, el avance en la tecnolog\u00eda y la IA, han demostrado dar grandes pasos en su evoluci\u00f3n, a fin de alcanzar \u201csu objetivo \u00faltimo que es simular la inteligencia humana\u201d. Pero en ning\u00fan caso podr\u00e1 tener la experiencia, la percepci\u00f3n del entorno, ni los sentimientos del ser humano que dan como resultado una obra original o individual aunando a que la IA tampoco es consciente del trabajo que realiz\u00f3, ni porqu\u00e9 lo efectu\u00f3 o con qu\u00e9 objeto lo hizo, a diferencia de un ser humano, por tanto, es que este derecho a la protecci\u00f3n de la autor\u00eda es intr\u00ednseco a la naturaleza humana, por lo cual la finalidad del derecho a la protecci\u00f3n de la autor\u00eda es la protecci\u00f3n del autor como persona f\u00edsica exclusivamente<\/em><\/p><\/blockquote>\n

Outro ponto relevante destacado na senten\u00e7a \u00e9 que produtos criados exclusivamente por intelig\u00eancia artificial, sem a participa\u00e7\u00e3o direta e substancial de uma pessoa f\u00edsica na etapa final da cria\u00e7\u00e3o, n\u00e3o s\u00e3o pass\u00edveis de prote\u00e7\u00e3o por direitos autorais, n\u00e3o podendo ser cadastrados ou registrados como tais. Consequentemente, essas cria\u00e7\u00f5es s\u00e3o automaticamente consideradas parte do dom\u00ednio p\u00fablico, ou seja, livres para uso por qualquer pessoa sem restri\u00e7\u00f5es legais de autoria.<\/p>\n

Para os neg\u00f3cios, essa decis\u00e3o traz uma reflex\u00e3o importante: embora a intelig\u00eancia artificial possa acelerar e inovar processos criativos, a prote\u00e7\u00e3o legal das cria\u00e7\u00f5es resultantes depende da presen\u00e7a efetiva da contribui\u00e7\u00e3o humana.<\/p>\n

As empresas que investem em desenvolvimento de conte\u00fado digital e inova\u00e7\u00e3o tecnol\u00f3gica precisam estar atentas a essa distin\u00e7\u00e3o, pois a aus\u00eancia de prote\u00e7\u00e3o intelectual pode impactar o controle exclusivo sobre ativos imateriais, afetando estrat\u00e9gias comerciais, valor de mercado e seguran\u00e7a competitiva.<\/p>\n

Portanto, na gest\u00e3o da inova\u00e7\u00e3o, \u00e9 fundamental garantir a participa\u00e7\u00e3o substancial do fator humano para assegurar a exclusividade e a prote\u00e7\u00e3o jur\u00eddica das cria\u00e7\u00f5es desenvolvidas com o suporte de IA.<\/p>\n

REPERCUSS\u00c3O GERAL<\/h2>\n

A decis\u00e3o da Suprema Corte do M\u00e9xico possui repercuss\u00e3o geral relevante, tendo se tornado paradigma para um vasto segmento tecnol\u00f3gico, especialmente impactando desenvolvedores de conte\u00fado digital, designers e artistas que se valem de ferramentas digitais para cria\u00e7\u00e3o em ambientes virtuais. Essa decis\u00e3o, amplamente debatida na m\u00eddia<\/strong><\/a>, tem implica\u00e7\u00f5es diretas sobre a tutela dos direitos autorais em contextos contempor\u00e2neos marcados pela crescente utiliza\u00e7\u00e3o de intelig\u00eancia artificial.<\/p>\n

No voto da ministra relatora, Lemia Batres Guadarrama<\/strong><\/a>, ficou clara a premissa jur\u00eddica fundamental de que, embora as tecnologias possam atuar como facilitadoras ou automatizadoras do processo criativo, a titularidade dos direitos autorais deve recair exclusivamente sobre indiv\u00edduos humanos. E neste sentido estabelece:<\/p>\n

53. El autor debe de ser una persona f\u00edsica. No puede ser un ente sint\u00e9tico o artificial. En este caso, la IA \u201cLEONARDO\u201d, esto porque el derecho a la protecci\u00f3n de la autor\u00eda es el derecho de autor que va dirigido a las personas f\u00edsicas, ya que son ellas por medio de su creatividad, experiencia, intelecto, emociones y el contexto de la persona f\u00edsica, que pueden crear una obra original. Por ende, s\u00f3lo se reconoce a las personas f\u00edsicas como autoras. <\/em><\/p><\/blockquote>\n

Ou seja, o n\u00facleo do direito autoral permanece firmemente centrado na pessoa f\u00edsica como autor leg\u00edtimo.<\/p>\n

A Corte reafirmou a interpreta\u00e7\u00e3o da legisla\u00e7\u00e3o mexicana em vigor, sancionando que o direito autoral cont\u00e9m uma limita\u00e7\u00e3o expl\u00edcita, segundo a qual apenas pessoas f\u00edsicas podem ser reconhecidas como titulares dos direitos autorais. Essa orienta\u00e7\u00e3o jurisprudencial encontra respaldo no posicionamento do Conselho de Direitos Humanos da ONU<\/strong><\/a>, que tamb\u00e9m sustenta que a titularidade moral dos direitos \u00e9 prerrogativa exclusiva do ser humano individual. Tudo como se extrai do pr\u00f3prio texto do julgado:<\/p>\n

57. En este sentido, la Corte Interamericana de Derechos Humanos (CIDH) ha dispuesto que, dentro del concepto amplio de “bienes” cuyo uso y goce est\u00e1n protegidos por la Convenci\u00f3n, tambi\u00e9n se encuentran incluidas las obras producto de la creaci\u00f3n intelectual de una persona, quien, por el hecho de haber realizado esa creaci\u00f3n adquiere sobre \u00e9sta derechos de autor conexos con el uso y goce de la misma.<\/em><\/p><\/blockquote>\n

Segundo esse entendimento, obras produzidas por intelig\u00eancia artificial n\u00e3o se enquadram na prote\u00e7\u00e3o do direito autoral, pois a cria\u00e7\u00e3o art\u00edstica ou intelectual configura um ato intrinsecamente humano, conforme previsto no artigo 27 da Declara\u00e7\u00e3o Universal dos Direitos Humanos<\/strong><\/a>.<\/p>\n

Em s\u00edntese, a decis\u00e3o materializa a prote\u00e7\u00e3o dos direitos humanos do autor, principalmente no que tange \u00e0 sua capacidade econ\u00f4mica de usufruir de sua obra, \u00e0 salvaguarda de sua liberdade criativa, \u00e0 integridade da obra e ao direito de ser reconhecido como seu criador leg\u00edtimo. Portanto, nem mesmo comandos isolados fornecidos a sistemas automatizados, tampouco \u201cprompts\u201d utilizados para gerar conte\u00fados por IA, podem ser qualificados como atos criativos dotados de prote\u00e7\u00e3o autoral. Tal distin\u00e7\u00e3o refor\u00e7a o car\u00e1ter personal\u00edssimo da autoria e delimita os contornos do que pode ser considerado objeto de tutela no \u00e2mbito do direito autoral.<\/p>\n

AN\u00c1LISE COMPARATIVA COM A LEGISLA\u00c7\u00c3O BRASILEIRA<\/h2>\n

Considerando o ordenamento jur\u00eddico brasileiro e os fundamentos do direito autoral e da propriedade intelectual, a decis\u00e3o da Suprema Corte de Justi\u00e7a da Na\u00e7\u00e3o do M\u00e9xico (SCJN), que rejeitou a concess\u00e3o de prote\u00e7\u00e3o autoral a uma imagem criada por meio de Intelig\u00eancia Artificial Generativa (IA), representa um posicionamento alinhado \u00e0 concep\u00e7\u00e3o tradicional da tutela autoral, segundo a qual o direito autoral pressup\u00f5e a exist\u00eancia de uma obra intelectual resultante da cria\u00e7\u00e3o humana dotada de originalidade e individualidade.<\/p>\n

Conforme os princ\u00edpios estabelecidos na legisla\u00e7\u00e3o brasileira e em tratados internacionais incorporados ao ordenamento nacional, o direito autoral protege as cria\u00e7\u00f5es intelectuais que sejam manifesta\u00e7\u00f5es originais do intelecto humano, independentemente do seu g\u00eanero art\u00edstico ou cient\u00edfico.<\/p>\n

A prote\u00e7\u00e3o recai sobre a express\u00e3o concreta da obra, abrangendo obras liter\u00e1rias, art\u00edsticas e cient\u00edficas, e resguarda os direitos morais e patrimoniais do autor, conforme disposto no artigo 7\u00ba e seguintes da Lei de Direitos Autorais<\/strong> <\/a>brasileira e nas garantias constitucionais dos arts. 5\u00ba, XXVII e 216 \u00a71\u00ba da Constitui\u00e7\u00e3o Federal\u00a0<\/strong><\/a> do Brasil.<\/p>\n

A utiliza\u00e7\u00e3o de recursos tecnol\u00f3gicos, incluindo algoritmos de Intelig\u00eancia Artificial, pode ser admitida como instrumento auxiliar no processo criativo, desde que o resultado final tenha a contribui\u00e7\u00e3o efetiva da atividade intelectual humana, garantindo, assim, a presen\u00e7a do requisito da autoria.<\/p>\n

Entretanto, quando a cria\u00e7\u00e3o decorre exclusivamente da automa\u00e7\u00e3o da m\u00e1quina, sem interven\u00e7\u00e3o criativa do indiv\u00edduo, a aus\u00eancia de autoria humana impede a concess\u00e3o do direito autoral, visto que a lei protege a exclusividade da express\u00e3o oriunda da mente humana, n\u00e3o sendo poss\u00edvel conferir direitos exclusivos sobre mera produ\u00e7\u00e3o mec\u00e2nica ou autom\u00e1tica.<\/p>\n

Nesse contexto, a decis\u00e3o da Suprema Corte mexicana, ao negar a prote\u00e7\u00e3o autoral a obras geradas integralmente por IA, coincidente com a vis\u00e3o jur\u00eddica brasileira, resguarda a integridade do sistema de prote\u00e7\u00e3o autoral, evitando a expans\u00e3o indiscriminada do conceito de autoria a entes n\u00e3o humanos, o que poderia fragilizar a efic\u00e1cia dos direitos exclusivos e introduzir inseguran\u00e7a jur\u00eddica.<\/p>\n

Ressalte-se que o registro de obras protegidas pelo direito autoral n\u00e3o produz presun\u00e7\u00e3o absoluta de autoria, cabendo \u00e0 inst\u00e2ncia administrativa ou judicial a verifica\u00e7\u00e3o da titularidade e da efetiva cria\u00e7\u00e3o intelectual humana envolvida.<\/p>\n

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